A permissão para a revista pessoal em caso de fundada suspeita depende da desconfiança justificada por dados concretos e objetivos de que o indivíduo esteja na posse de armas ou de outros objetos ilícitos, indicando urgência na ação policial.
Com esse entendimento, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial para anular as provas contra um homem que, com base em denúncia anônima, foi abordado na rua, revistado e teve a casa invadida.
A denúncia indicou que o suspeito recebia havia algum tempo drogas pelos Correios, em sua residência. Ao chegar ao local, os policiais observam-no sair de casa para receber uma encomenda na calçada e decidiram fazer a abordagem.
Com ele, encontraram 46 vidros de lança-perfume. Por isso, resolveram entrar na residência do suspeito sem autorização judicial e lá apreenderam 1,11 grama de cocaína e 1,68 grama de maconha.
O Tribunal de Justiça de São Paulo validou a ação policial porque o ingresso no imóvel foi autorizado pelo residente e porque o crime de tráfico de drogas é considerado permanente, o que torna constante o estado de flagrância.
Provas nulas
Relator do recurso, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca observou que o acórdão do TJ-SP não menciona investigações prévias, nem elementos concretos que indicariam que a encomenda entregue ao acusado contivesse entorpecentes.
Assim, a primeira abordagem já foi ilícita, pois precisaria ser fundada em algum dado concreto que justificasse, objetivamente, a invasão à privacidade ou à intimidade do indivíduo.
“Não houve qualquer referência a prévia investigação, monitoramento ou campanas no local, havendo, apenas, a ‘suspeita’, o que, conforme pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não configura o elemento ‘fundadas razões’ a autorizar a abordagem e posterior ingresso no domicílio, o que torna ilícita a prova derivada dos procedimentos”, disse o magistrado.
O voto ainda ressaltou a jurisprudência pacífica no sentido de que, ainda que o tráfico de drogas seja crime permanente, a invasão de domicílio por policiais só é válida se existirem elementos suficientes de probabilidade delitiva.
Jurisprudência em construção
As razões que permitem a abordagem de pessoas na rua ainda estão sendo analisadas e definidas pela jurisprudência do STJ, tribunal responsável por dar a última palavra na interpretação do direito federal.
A premissa básica é de que são necessárias fundadas razões, que possam ser concretamente aferidas e justificadas a partir de indícios. Isso elimina a ação baseada no tirocínio policial — na experiência prática, contaminada por preconceitos como os de classe ou raça.
Aos poucos, o STJ percebeu que essa análise precisaria ser mais flexível. Assim, denúncia anônima e intuição policial não justificam que alguém seja parado e revistado na rua. Por outro lado, fugir ao ver a polícia é motivo suficiente
Entre os exemplos de construção dessa jurisprudência, estão os julgados em que o STJ concluiu ser ilícita a ação da polícia motivada pelo mero fato de duas pessoas estarem em uma moto ou pelo motorista estar usando capacete em local onde isso não é a praxe.
Estar em ponto de tráfico e ser conhecido no meio policial também não bastam para esse tipo de ação dos agentes.
Em sentido oposto, demonstrar nervosismo ao ver a presença policial pode bastar para a busca pessoal, desde que aliado a outros fatores. Dar respostas vagas e imprecisas para perguntas simples feitas por policiais também é outro exemplo.
Fonte: Danilo Vital